terça-feira, 9 de junho de 2009

Discurso de posse proferido no auditório Robson Faria, Assembléia Legislativa do RN, 20/05/2009

PORQUE ESTAMOS AQUI

Para salvaguardarmos a cultura popular potiguar, parte integrante do legado cultural brasileiro, nascido da utopia dos descobrimentos, modelados pelos ensinamentos cristãos, com a água e pó sal do batismo, o madeiro sagrado, a escolha de santos como padroeiros, capelas e templos nos engenhos e fazendas de gado uma vida que girava entre o sagrado e o profano, a fé e o pecado, devendo obediência aos senhores de terras, instalados em casarões fortificados, armados e municiados, numa sintonia quase perfeita com padres santos, rosários, terços e novenas em nome da fé.
Nenhuma sociedade no mundo foi formada com esse quadro genético, eis a razão de sermos diferenciados e termos a mais rica diversidade cultural do planeta.
O processo da globalização, com suas constantes e rápidas mudanças, traz em seu contexto uma produção conflitante com nossa realidade sócio-cultural, um momento da vida brasileira que preocupa os estudiosos da folclorística.
Sabemos muito bem que como todas as demais ciências, o folclore também acompanha o processo de mudanças evidenciadas por um mundo em transformação. Ocupa novos espaços, em qualquer contexto social, por mais complexo que seja o estágio cultural de seus componentes, ao nível de produção, adoção ou ainda de consumo dirigido. Mas sabemos muito mais que é preciso estudá-lo, conhecê-lo, porque ele é a ciência de salvaguarda da cultura popular em qualquer parte do mundo. No caso Brasil, sobretudo o Nordeste, em particular o Rio Grande do Norte, o folclore é um documento que precisa ser respeitado e preservado para evitar o uso equivocado, com paradigmas estereotipados não condizentes aos princípios fundamentais de uma ciência tão complexa e importante que de um lado perfila, com suas justas aspirações na busca da preservação da identidade nacional e, do outro, associa os fatos da história cotidiana no processo de afirmação social. Nós brasileiros temos, que fazer a opção entre preservar, defender e divulgar este rico e fabuloso patrimônio estético ou vê-lo aprisionado no altar da globalização
Nos dias atuais, o folclore não pode, nem deve ficar preso aos pontos básicos pelo qual foi visto durante muito tempo, quais sejam: anonimato, persistência, antiguidade e oralidade. Ainda que esses aspectos de forma insofismável permaneçam sendo os pilares que sustentaram a base de todo os estudos da hoje reconhecida Ciência do Folclore.
Foi abolida a clássica definição do folclore, entendido como complexo das classes subalternas e instrumentais, que se contrapunha às classes oficiais, eruditas, hegemônicas e dominantes. Precisamos apenas entender: que vida, que povo, que classes, de que forma e em que circunstância foi e é desenvolvido o fato folclórico.
Não é mais aceitável o tradicionalíssimo conceito da carta de Willian John Thoms (1803-1855), Folk (povo), Lore (saber), oriundo do antigo inglês falado na Inglaterra.
Atualmente o folclore passa por uma releitura, com nova conceituação, visibilidade e dinâmica, aos direcionamentos que deve interagir como instrumento de salvaguarda da cultura brasileira, que guarda ainda um rico acervo da cultura medieval, sem ter vivenciado a Idade Média. Nenhum país no mundo detém tão rico acervo, daí a preocupação dos estudiosos para que a sociedade brasileira tome conhecimento desse fato e passe a valorizar esse rico mosaico de cultura popular não existente em nenhuma parte do planeta.
Em 1995, durante a realização do VIII Congresso Brasileiro de Folclore, realizado na cidade de Salvador, Bahia, ao qual a Comissão Norte-rio-grandense de Folclore esteve presente, reuniram-se os mais expressivos estudiosos da ciência de Thoms. Nessa oportunidade procederam a releitura da Carta do Folclore Brasileiro, aprovada no I Congresso, realizado no Rio de Janeiro, de 22 a 31 de agosto de 1951.
Esta releitura, ditada pelas transformações de uma sociedade em mudança e pelo progresso das Ciências Humanas e Sociais teve ampla participação de estudiosos dos diversos pontos do país, e também de representantes da UNESCO, apresentando suas recomendações sobre a salvaguarda do folclore por ocasião da 25ª Reunião da Conferência Geral, realizada em Paris, em 1989 e publicada no Boletim nº 13 da Comissão Nacional de Folclore, janeiro/ abril de l993.
Na nova Carta do folclore Brasileiro está explícita a moderna conceituação de folclore, como sendo: “o conjunto das criações culturais de uma comunidade, baseado nas suas tradições, expressas individual ou coletivamente, representativo de sua identidade social, respaldado na aceitação coletiva, tradicionalidade, dinamicidade e funcionalidade”. Folclore e cultura popular são equivalentes, como preconiza as recomendações da UNESCO, contudo a cultura popular permanece no singular como única e legítima, embora existam tantas culturas, quanto sejam os grupos que a produzam, em contextos naturais diferentes, específicos.
Os estudos de folclore, como parte integrante das Ciências Humanas e Sociais, devem ser realizados de acordo com metodologias próprias dessas Ciências.
Sendo parte integrante da cultura nacional, as manifestações do folclore são equiparadas às demais formas de expressão cultural, bem como seus estudos aos demais ramos das humanidades, conseqüentemente deve ter o mesmo acesso, de pleno direito, aos incentivos públicos e privados concedidos à cultura em geral e às atividades científicas através da pesquisa, ensino-educação, turismo, atividades parafolclóricas, comunicação de massa, publicações, intercâmbio, hierarquias.

Severino Vicente – Presidente da Comissão Norte-Riograndense de Folclore

2 comentários:

  1. Caro Confrade,

    Parabéns pela posse. Pessoalmente não tomei conhecimento do fato, mesmo sendo sócio dessa instituição. Com certeza esse blog vai corrigir esse desencontro de informações.
    Parabenizo, igualmente, a todos que fazem a nova diretoria da Comissão Norte-Riograndense de Folclore.
    Aproveitando a oportunidade, divulgo o endereço do meu blog sobre a História de Mossoró.

    Um abraço,

    Geraldo Maia do Nascimento

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  2. Divulgando um blog sobre a História de Mossoró:
    www.blogdogemaia.com

    Um abraço,

    Geraldo Maia do Nascimento

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